segunda-feira, 19 de abril de 2010

O som do silêncio

Constatação: Noite passada estive diante de algo que não merece constatações: O amor.

  Uma trilha sonora irlandesa embala a noite. Debaixo de um chão de compensado de madeira o protagonista de uma das maiores divindades do ser humano tocava a própria trilha para quem quisesse ouvir. E quem não ouvisse tbm. Um músico. E como todo músico, gosta de ser ouvido. E como todo músico, se arranjasse uma mulher, arranjaria uma mulher que lhe acompanhasse, lhe ouvisse, prestasse atenção no que mais gosta de fazer. 

- Já presenciei uma cena assim antes: Ela fitava-o com olhos de comer uma torta alemã com amoras. Ele tocava uma bossa nova, e ela dançava com os olhos o ritmo da melodia feita só para ela naquele momento. O homem trabalhava, a mulher o acompanhara, mas pareciam estar sozinhos num quarto, no momento mais intimo do seu amor, provando da mais luxuosa cena de amor protagonizada pelos próprios na cama com um único abajur em uma escrivaninha mal iluminada. As cortinhas balançavam ao som do vento (parte da música) dançando uma valsa ao ritmo da bossa em volta do violão. Isso acontecia na minha frente. Era uma simples troca de olhar entre um músico em um bar (trabalhando) e sua mulher assistindo-o à 2 metros de distância. - 

  Mas dessa vez eu presenciei dois mundos unidos por duas interpretações diferentes da mesma coisa. A música (amor). Dizem que o amor é vibração. E eu digo que acredito.
  Ela estava lá parada enrolada nos caracóis dos cabelos dele, prendidos por um chapéu panamá. Encostada em uma pilastra. Ela sorria. Sorria escutando-o. Mais do que qualquer outro ali, ela o escutava. Ele e sua banda faziam seu som. A principio se parece com a história do outro casal que contei em cima se não fosse por um fator: Ele ama o que faz. Ela o ama e vice-versa. A "vibração do amor" para os dois é amor sentido e vibração sentida. 
  Ela estava lá, parada enrolada nos caracóis dos cabelos dele, encostada em uma pilastra sentindo as vibrações do som, do que ela mais ama fazer, do amor dele. Ela lia os lábios dele ao mesmo tempo que a pilastra lhe dava o som de sua música. Ela ouvia a música dele, mas nunca vai ouvir a musica que ele ouve. Mesmo assim eles ouvem a mesma música por intermediação do amor que sentem, do qual os olhos não mentem. Ele era músico, ela deficiente auditiva de nascença. Ele escolhera para si uma mulher desprovida do instrumento mais importante para um músico. A mulher que o acompanhará, que o escutará nos momentos mais íntimos. A mulher que não o ouve. Ela lê lábios, sende vibrações do som, lê seu coração e sente as vibrações dos dois corações. Ele aprenderá uma nova música com ela. Um privilégio que poucos músicos tem.

  Um privilégio que poucos seres humanos tem: Ter esse amor. 
  Eu tive. Eu vi. Eu senti os dois. Eu chorei naquele dia. Minhas lágrimas caíam cortando a gravidade cantando. Descobri um pouco mais sobre o amor naquele dia.

  Só mesmo o amor.

Um comentário:

  1. assim como quando você me contou ontem, fiquei arrepiada dos pés a cabeça... sem palavras pra isso tudo, é incrível, queria eu estar lá pra sentir pelo menos metade do que você sentiu... queria eu ter um amor assim, ou um terço disso, que com certeza desconheço... que me dera. (parabéns, suas palavras foram PERFEITAS)

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